sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Amor tumor

O amor é um câncer.
Chega devagar, desregula o organismo.
Quando curado, deixa marcas.
Se fortalecido, traz desesperança.
Por vezes, enriquece a alma. Quando extirpado, deixa traumas.
Por fora tudo está normal. Exceto por minha aparência, arrogante e pálida.
Tua ausência aumentou minha sobrevida, longa e interminável.
Teu amor me fez doença.
Seu rancor me fez tumor.

Fim de jogo


Tudo embaralhado.
Os naipes estão repetidos e todos os coringas se perderam no meio do caminho.
O amor é, definitivamente, um jogo perdido.
As cartas são escondidas e as jogadas puramente estratégicas.

Seu jogo dramático ficou canastrão e, aos poucos, percebi teus vícios.
As regras deixaram de valer porque descobri que o amor não é uma loteria. Tampouco pode ser comprado com seu podre dinheiro.
Pegue todas as tuas fichas e esse copo de uísque quente e repugnante.
Cansei do teu jogo de azar e de tuas apostas inconseqüentes.
Não sou mais teu passatempo.
Game Over.

Um salto a mais

Mulheres são flores, são espinhos.
Drama, romance, às vezes suspense.
Frágeis, fortes. Frias, quentes.
Ninguém decifra as mulheres.
Cada uma é uma.
Insubstituível.
Única.

Juízo Final


Meu amor é masoquista. Um Cristo que se prega na cruz, por vontade própria, e a carrega apenas por uma mera penitência. Uma indulgência lenta e cruel, que sangra aos poucos. Que seca em meio a uma longa e árida peregrinação.
Vigio tua vida de longe, como um jogo de espelho. Acompanho por trás da persiana teus devaneios, tuas glórias, teus fracassos, teus amores.
Minha paixão é surda e muda. Oxalá que fosse cega. Talvez furar os olhos doesse menos do que acompanhar tua existência, feliz e bem-sucedida. O prazer de sofrer, contudo, é mais doentio, mais sádico, mais vicejante.
Tua indiferença me excita. Tua ausência, sufoca. E sabes disso. Matas-me lentamente, como quem desliga uma máquina de oxigênio e a religa para recomeçar tudo novamente, em um ciclo vicioso.
És causa e conseqüência do meu martírio. Sou inquilino do teu purgatório, teu Judas, que um dia vai te trair e te crucificar. Enquanto isso, eu te vigio de longe e arquiteto tua cruz.
Tudo será religiosamente projetado. Darás teu sangue para salvar a humanidade de tua indiferença.

Dilúvio


Está chovendo dentro de mim.
Um orvalho frio umedece meu corpo e inebria meus olhos.
Tudo ecoa neste vazio: gritos e choros.
Até o silêncio reverbera.Estou só dentro de mim mesmo.
Queria poder desaguar todo meu oceano.
Enquanto o cultivo, uma ressaca agita meu peito.
Estou mareado, cansado do salitre que envelhece minhas pálpebras.
Um dia meu sentimento transborda. E o sertão vai virar mar.
Far-se-á dilúvio em mim.
Molhado e feliz, saberei que minha vida era seca pelo simples fato de ter medo de amar.

Brainstorm


Eu só quero que o dia acabe.
Que essa nuvem cinza que me acompanha desabe em tempestade.
Que o vento sopre forte e me arremesse longe.
Que todos os raios caiam na minha cabeça.
Que bom seria.O dia acabaria.
Calmaria.

Um pouco de mim


Sou publicitário. Lido todo dia com fotos de pessoas felizes, brindando uma vida perfeita, longe dos problemas, abraçadas com a solução. Em meus anúncios todos têm dentes brancos e perfeitos. São altos, louros e de olhos claros. As famílias são completas, geralmente acompanhadas de um belo cão labrador.

Sou genitor de criaturas de um mundo utópico. Minhas peças enaltecem o belo, o superficial, momentos de uma falsa felicidade. Mentirosa, pois se apaga junto ao clarão do flash. Se a família feliz sorri é porque lhes pago cachê. Se os dentes são claros e bem formados, é porque a produtora os selecionou. E também foi bem remunerada para isso.

Eu sou baixo, levemente calvo e tenho uma barriga nada sensual, mas produzo final feliz e crio estereótipos convencionais. Pessoas que eu queria ser, com quem queria estar. Com um lápis na mão e uma idéia na cabeça tenho autonomia para tudo. Posso ser profundamente infeliz e representar alegria e muito sucesso. A vida é uma grande propaganda. Mas no fundo, bem no fundo, há um produto igual a todos os outros, com preço acessível, produção limitada e pontos de venda pra lá de esdrúxulos. Na verdade sou apenas mais uma embalagem na prateleira. Comum por fora, diferente por dentro. Sou publicitário.